MRS. SIMPLE [#2]: IN LOVE TALKING

Durante esta semana, andei a bisbilhotar… sim, bisbilhotar. É que estas coisas do amor me fascinam. As conversas dos apaixonados são singulares, muito singulares.

Quando andei por aí a vasculhar deparei-me com uma parte da população que fala de forma estranha. Primeiro pensei que fosse um código e que poderiam, quiçá, estar numa missão especial e serem agentes secretos. Que falassem assim para que a mensagem não fosse decifrada. Mas não! O assunto era bem mais emocionante. Eles são apaixonados. [não me enganei, há mesmo pessoas que parece que encarnam a expressão de tão melados].

É um facto que quando as pessoas se sentem apaixonadas o seu grau de estupidez aumenta a níveis astronómicos e o seu nível de QI baixa severamente. Ficam muito vulneráveis portanto!

Perante este sentimento tão evasivo os comuns mortais perdem a capacidade de dialogar um com o outro de forma normal e ele passa a ser o “môr”, o “morzinho” ou o “morzão” e ela passa a ser a “querida” ou a “princesa”. E nem vale a pena dizer-lhes nada que soltam logo coisas do tipo: “você é que não sabe amar!”, “É azeda” ou num acto de crueldade/chega pr’a lá, nos chamam de “mal amados”.

No que a mim me cabe entender [que é nada, afinal] tudo isto me causa arrepios [e dos sérios]. É como se as pessoas perdessem a sua identidade própria [e o nome, que é o pior] e aquela relação passasse a ser a sua nova identidade. Como se os seres apaixonados usando este tipo de linguagem estivessem presos numa realidade paralela em que naquele período de tempo, ela encarna toda uma deusa e ele todo um príncipe encantado.

Penso que seja por isto [e por questões hormonais também] que a grande parte dos amores morra na praia da paixão…

Adiante.

Quando se ama fica-se infantilizado. As defesas baixam perigosamente e a entrega é quase total. A criança que há em cada um espera que desta seja amada e mimada acima de todas as coisas e que aquele ser que nos corresponde colmate de vez as feridas que ficaram abertas lá atrás.

Não sabemos amar como mulheres, sem “morzinhos” nem “princesas”. Como adultos seguros, entendem? Confiantes e sem feridas passadas que esperamos que alguém lamba por nós. Meta na sua cabeça que somos adultas, logo o seu namorado não é seu pai nem seu fã nem seu criado. E também não se disponibilize a fazer de mamã de homens crescidos, que isso é deprimente.

Na minha bisbilhotice pela rede, percebi que estas coisas dos “diminutivos carinhosos” é gramaticalmente e culturalmente muito diversa, ora vejam:

Há o amor botânico: “Minha Flor”, “Minha rosa” ou até coisas mais do tipo hortícola “Meu Chuchu” [que penso que na gramática do amor se escreva “Xuxu”];

o amor animal: “Meu gato”, “Minha gatinha” [neste separador os brasileiros vencem porque depois do amor, o reino animal passa a “Sua cachorra” e “Seu galinha”];

o amor fantástico: “Minha fada”, “Meu dragão”;

o amor gastronómico: “Meu docinho” [há até quem dê nomes de pratos e sobremesas];

o amor selvagem: “Meu leão, tigre, etc.” e espelha para o feminino.

E isto é só o começo de todo um discurso erudito. A prefixação, sufixação e até neologismos derivados dos mais profundos  substantivos e adjectivos disponíveis nesta nossa língua de Camões são amplamente usados pelo ser que está possuído pela paixão. O uso de figuras de estilo torna-se usual entre os românticos e toda uma gramática complexa ganha vida.

Mas afinal, quem serão todas estas personagens? Quando oiço alguma amiga chamar estridentemente o “Môr”, lá costuma vir o par de calças residente com um ar de quem se vai fazer muito útil e provar que afinal das contas, serve para alguma coisa [nem que seja para as pagar]… uma espécie de mordomo às ordens com que fazem sexo avulso… mas enfim…

Resolvi fazer uma experiência. Sentei-me numa cadeira no meio da cozinha e em alto e bom som também eu gritei “Oh Môr!?!”. Tiro certo! Lá veio o meu bulldog Inglês com um ar pachorrento arrastando-se nas pregas do excesso de peso. Sentou-se a olhar para mim com um ar expectante e eu para não desiludir lá lhe dei um biscoito.

Voltei a repetir… e lá voltou a aparecer o bulldog inglês, desta com um ar já muito mais feliz e entusiasmado. Um pacote de biscoitos depois conclui: a paixão e todo este discurso ridículo dos apaixonados está para nós humanos como o pacote dos biscoitos está para o bulldog inglês! Quem chama espera ver colmatadas as suas expectativas e lacunas e quem responde também espera o mesmo. Pena mesmo é que a expectativa seja diferente para ambas as partes e a “parceria romântica” só dure até ao final do pacote dos biscoitos.

E quando tudo isto nos basta… estamos mal amigas!

— por MRS. SIMPLE

(o diabrete virtual)

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Às terças por Mrs. Simple